quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Quem sabe o que está escrito aqui?

Quem sabe o que está escrito aqui?

Rosa Emília de Araújo Mendes
Aos sete anos, quando entrei para a escola, a professora mostrava as letras em um papel grande e perguntava:

— Quem sabe o que está escrito aqui?
Eu ficava admirada por ela não saber e ia lendo para ela, do jeito que minha avó tinha me ensinado — que era contando histórias de “era uma vez”.
Um dia, Dona Sílvia ficou muito brava e me perguntou:             
— Você é repetente?
Como a professora vivia sempre falando o nome todo da gente, eu respondi:
— Não, senhora, eu sou Araújo Lacerda.
Ela ficou mais zangada ainda, e eu parei de ler a lição. Parecia que Dona Sílvia não sabia contar histórias, e eu não gostava de letras.
Descobri, porém, que os armários da sala de Dona Sílvia continham muito mais livros do que o armário de minha avó. Comecei a levar todos eles, um por um, para ler na hora do recreio ou em casa, depois da aula.
Um dia, Dona Sílvia parou de perguntar as letras daquele papel, abriu um livro muito bonito e leu uma história para nós. Gostei muito daquela aula!
Percebi que Dona Sílvia sabia muitas outras coisas. Com certeza, foi com ela que eu passei a entender melhor o mundo que começava depois de nossa casa, da casa do vizinho e depois da esquina de minha rua.
No final do ano, Dona Sílvia me disse que estava feliz, porque eu tinha aprendido todas as letras e já sabia escrever.
Não me lembro se falei com ela, mas eu também tinha ficado feliz desde aquele dia em que descobri que ela também sabia ler.


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